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Presidencialismo como sistema de governo: noções gerais, capacidades governativas e especificidades do caso brasileiro.



Marcelo Cordeiro, Ulysses Guimarães e Mauro Benevides apresentam o modelo da Constituição que foi promulgada em 1988.
Marcelo Cordeiro, Ulysses Guimarães e Mauro Benevides apresentam o modelo da Constituição que foi promulgada em 1988.


Descubra as características fundamentais do presidencialismo, sistema de governo marcado pela concentração de poder na figura do Presidente da República. Entenda as relações entre os Poderes Executivo e Legislativo, onde o Executivo atua de forma independente, diferenciando-se do parlamentarismo. Saiba como o Presidente é legitimado autonomamente e conheça os procedimentos para sua destituição em casos de crimes de responsabilidade.


Presidencialismo

Para a Teoria Política basicamente existem dois grandes modelos de sistema de governo: o parlamentarismo (e suas diversas variações) e o presidencialismo.

Estes sistemas se distinguem por dois pontos:

  • o sistema parlamentarista de governo apresenta uma forma de legitimação popular indireta no plano do Poder Executivo. O povo elege o parlamento e este é o responsável pela nomeação do Chefe do Poder Executivo, titularizado pelo Primeiro Ministro, que se torna o responsável pela nomeação do Gabinete e pela execução das leis e administração do interesse público sob a confiança do Legislativo. Há uma cisão entre Chefia de Governo e Chefia de Estado. O Primeiro Ministro é o Chefe de Governo. No presidencialismo, diferentemente, tanto o Poder Legislativo quanto o Executivo possuem legitimação popular sendo ambos eleitos pelo povo.  

  • no parlamentarismo não existe mandato para o Poder Executivo, ou seja, o Primeiro Ministro e seu Gabinete podem ficar no comando da administração pública de um dia até longos anos. Enquanto durar a confiança do parlamento o Gabinete permanece. No presidencialismo, o Poder Executivo possui um mandato fixo – no Brasil, atualmente, de 4 anos –, sendo que exercício da gestão independe da confiança do parlamento. 

A partir destas distinções, é possível perceber que o parlamentarismo e a presidencialismo são sistemas que trabalham a partir de lógicas distintas. Enquanto as crises do parlamentarismo são resolvidas com a dissolução do parlamento. No presidencialismo há diversas formas de lidar com as crises, a forma mais popular é através das negociações com o Legislativo.

No presidencialismo, a partir do momento em que se atribui legitimação popular direta ao chefe do Poder Executivo, atribuindo-lhe mandato fixo, só há duas formas institucionalizadas de se derrubar ou mudar o governo: realização de novas eleições após o término do mandato ou a condenação do Presidente da República em processo de impeachment por acusação de crime de responsabilidade. E desta forma, se não há crime cometido, nada pode derrubar o Chefe do Poder Executivo. O presidencialismo, portanto, é um sistema de governo tendencialmente gerador de mais tensões. A legitimação popular do Presidente da República impede que ele seja derrubado em quaisquer momentos de crise. Neste sistema, ainda que o governo seja ruim, tome medidas impopulares, perca apoio político do parlamento, ou não enfrente as crises de forma adequada, ele não pode ser derrubado. Há, como se disse, um potencial conflitivo nas relações Executivo versus Legislativo maior no presidencialismo.  

No presidencialismo a estabilidade política é inconstante. Ela depende de diversos fatores dentre eles: do partido político do presidente da república possuir maioria no parlamento, sozinho ou através de coalizões; do desempenho político, social e econômico do governo ou do prestígio pessoal do presidente.

Estabilidade e governabilidade, no presidencialismo, são consequência de uma rede de fatores. Concretamente é possível afirmar que no presidencialismo, sem apoio do Legislativo pode até existir certa estabilidade, mas inexiste capacidade de governabilidade.


Presidencialismo Brasileiro

Durante o período do Brasil Império – no Segundo Reinado (1840 -1889) –, e, durante a república (1961 - 1963) adotou-se o parlamentarismo como sistema político.

O presidencialismo se afirmou como sistema de governo desde a primeira constituição republicana (1891) e, sempre que foi colocado sob teste popular, triunfou. Em 1963 a realização de plebiscito garantiu ampla vitória do presidencialismo em detrimento do parlamentarista.

A Constituição de 1988 previu a realização de plebiscito após cinco anos de experiência constitucional para que o povo pudesse mais uma vez deliberar sobre sistema de governo e forma de governo. Em 1993 o resultado do plebiscito elegeu novamente o presidencialismo como sistema de governo brasileiro. 

Na Constituição de 1988 o tema dedicado ao Poder Executivo e ao sistema de governo está disciplinado em capítulo próprio, no título da separação dos poderes (título IV), entre os arts. 76 e 91. 


Art. 76. O Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República, auxiliado pelos Ministros de Estado.

 Art. 91. O Conselho de Defesa Nacional é órgão de consulta do Presidente da República nos assuntos relacionados com a soberania nacional e a defesa do Estado democrático, e dele participam como membros natos:

I - o Vice-Presidente da República;

II - o Presidente da Câmara dos Deputados;

III - o Presidente do Senado Federal;

IV - o Ministro da Justiça;

V - os Ministros militares;

V - o Ministro de Estado da Defesa;       

VI - o Ministro das Relações Exteriores;

VII - o Ministro do Planejamento.

VIII - os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica.        

§ 1º Compete ao Conselho de Defesa Nacional:

I - opinar nas hipóteses de declaração de guerra e de celebração da paz, nos termos desta Constituição;

II - opinar sobre a decretação do estado de defesa, do estado de sítio e da intervenção federal;

III - propor os critérios e condições de utilização de áreas indispensáveis à segurança do território nacional e opinar sobre seu efetivo uso, especialmente na faixa de fronteira e nas relacionadas com a preservação e a exploração dos recursos naturais de qualquer tipo;

IV - estudar, propor e acompanhar o desenvolvimento de iniciativas necessárias a garantir a independência nacional e a defesa do Estado democrático.

§ 2º A lei regulará a organização e o funcionamento do Conselho de Defesa Nacional.       


De acordo com o sistema brasileiro o presidente da república é o chefe do Poder Executivo e exerce a sua função auxiliado pelos Ministros de Estado e pelo Vice-Presidente. O mandato do Presidente da República é de 4 anos, admitindo-se a recondução para o mandato imediatamente subsequente uma única vez. A eleição é direta, exigindo-se maioria absoluta que, se não for obtida em primeiro turno de votação, determina a realização de um segundo turno com os dois candidatos mais votados no primeiro turno. O Vice-Presidente é eleito junto com o Presidente sendo necessariamente o registrado por este último.

A Constituição de 1988 prevê o procedimento de impeachment para os casos de prática de crime de responsabilidade, considerando-se como tais aqueles que atentem contra:

  1. a existência da União,

  2. o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da federação,

  3. o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais,

  4. a segurança do país,

  5. a probidade na administração,

  6. a lei orçamentária e

  7. o cumprimento das leis e das decisões judiciais.

O processo de impeachment demanda autorização da Câmara dos Deputados pela maioria qualificada de 2/3 (342 votos de um universo de 513) e julgamento perante o Senado Federal em caso de crime de responsabilidade ou perante o Supremo Tribunal Federal em caso de crime comum.

No que diz respeito com as funções o presidencialismo brasileiro se enquadra no modelo do que se designa como presidencialismo imperial, ou hiper-presidencialismo, tendo em vista o grande acúmulo de poderes concentrados no Poder Executivo. Com efeito o presidente da república possui ampla atribuição de iniciativa, o que lhe confere grande poder agenda. 

Quase todas as matérias relevantes em termos de definição de políticas públicas, definição de prioridades orçamentárias e alocação de recursos é de iniciativa privativa do presidente da república, assim como quase toda matéria que diz respeito à organização administrativa. 

O presidente da república, nesta seara, consegue manter um elevado grau de dominância das matérias discutidas no Congresso Federal. A agenda política é primordialmente definida pelo presidente. Ademais, em todas as matérias de sua iniciativa chefe do Poder Executivo ainda possui a prerrogativa de solicitar urgência, obrigando com que os temas por ele proposto sejam obrigatoriamente enfrentados em prazo relativamente curto de até 90 dias. E nesta hipótese, caso as matérias encaminhadas pelo presidente não sejam apreciadas, ocorre o bloqueio da pauta. Se a matéria ainda não for aprovada de acordo com a definição ou na forma proposta do presidente cabe-lhe o exercício do veto, que devolve a matéria ao Congresso Nacional e só pode ser derrubado com a manifestação da maioria absoluta. Exceto em relação às Emendas Constitucionais e algumas matérias de competência de privativa da Câmara e do Senado e matérias de competência exclusiva do Congresso Nacional, o veto sempre é admitido. 

O presidente ainda possui competências legislativas através da possibilidade de edição de medidas provisórias ou através da edição de leis delegadas, além de ampla competência regulamentar no campo administrativo. Ele também é responsável por indicar e nomear uma expressiva gama de cargos, tais como Ministros do Supremo Tribunal Federal, Ministros dos Tribunais Superiores, Procurador-Geral da República, presidente e diretores do Banco Central, Ministros do Tribunal de Contas da União, dentre outros, além de obviamente nomear e demitir ad nutum os Ministros de Estado. É de sua competência privativa decretar a intervenção federal e o estado de sítio. E a isso somam-se as funções inerentes à chefia de estado (representação do país, assinatura de tratados, declarar guerra e celebrar a paz etc.).

Portanto no modelo de presidencialismo, o presidente possui capacidade de dominar a agenda política, retirar temas da pauta, vetar, produzir atos normativos independentemente de autorização legislativa e ainda, consegue direcionar e aprovar a maioria de suas propostas no parlamento.


Presidencialismo de Coalizão

O presidencialismo de coalizão resulta de um arranjo institucional específico que combina hiperpresidencialismo, multipartidarismo, eleições parlamentares baseadas na proporção com lista aberta e federalismo. Não é exclusivo do Brasil e nem uma novidade, pois os teóricos da Ciência Política o identificaram antes da Constituição Federal de 1988.

A essência do presidencialismo de coalizão sustenta que a governabilidade requer (i) coalizões na formação da aliança, (ii) coalizões na formação do governo e (iii) coalizões governantes.

Inicialmente concebida como uma descrição, essa categoria reflete o funcionamento do sistema brasileiro, que viabiliza a governabilidade na transição democrática.

Os conceitos de coalizão na formação da aliança, coalizão na formação do governo, coalizão governante e suas dinâmicas, bem como o voto de liderança, fidelidade partidária, o papel do "baixo clero", a distribuição de cargos estratégicos, o financiamento de campanhas e o poder legislativo das Medidas Provisórias orientam esse sistema.

No presidencialismo de coalizão, as alianças políticas regionais e partidárias tornam o Legislativo dependente do Executivo. Para manter a governabilidade, o Executivo cede às pressões da aliança, muitas vezes contraditórias e setoriais.

Embora tenha proporcionado estabilidade, o presidencialismo de coalizão não construiu um projeto de Estado coeso e republicano, falhando em gerar consensos legítimos.

Críticos apontam sua tendência antidemocrática, vulnerável à corrupção e ao patrimonialismo, resultando em um bloco de poder centralizado no Presidente, enfraquecendo a fiscalização do Parlamento.

A lógica das alianças não promove políticas públicas coerentes, pois cada setor do Estado é ocupado por interesses diversos da coalizão. Além disso, a atuação parlamentar fortalece as lideranças da aliança, perpetuando o clientelismo e a defesa de interesses particulares.

De acordo com Nicos Poulantzas, no Brasil, esse arranjo institucional não implica em verdadeira separação de poderes, pois o Estado age como um bloco de poder único.O presidencialismo de coalizão é também uma ideologia, que mascara a verdadeira natureza mercadológica e clientelista do Estado, impedindo a deliberação efetiva no Legislativo e no Executivo.

Pontos Principais


Noções Gerais

O presidencialismo é um sistema de governo no qual o presidente é tanto o chefe de estado quanto o chefe de governo. Este sistema é caracterizado pela separação dos poderes executivo, legislativo e judiciário.

No presidencialismo, o presidente é eleito diretamente pelo povo para um mandato fixo e não pode ser destituído pelo parlamento durante esse período, exceto em casos de impeachment por crimes de responsabilidade.


Capacidades Governativas

No presidencialismo, o presidente tem amplos poderes para governar. Ele é responsável pela execução das leis, pela política externa e pela administração pública. Além disso, o presidente tem o poder de vetar leis aprovadas pelo parlamento e de emitir decretos executivos.

O presidente também tem o poder de nomear ministros e outros altos funcionários do governo. No entanto, essas nomeações geralmente requerem a aprovação do senado.


Especificidades do Caso Brasileiro

O Brasil é uma república federativa presidencialista. O presidente do Brasil é tanto o chefe de estado quanto o chefe de governo e é eleito para um mandato de quatro anos, com a possibilidade de reeleição para um mandato consecutivo.

No Brasil, o presidente tem o poder de nomear os ministros do Supremo Tribunal Federal, com aprovação do Senado, e de dissolver o Congresso em certas circunstâncias. Além disso, o presidente brasileiro tem o poder de emitir medidas provisórias com força de lei.

No entanto, o presidencialismo brasileiro também tem suas peculiaridades. Por exemplo, o Brasil tem um sistema multipartidário, o que muitas vezes leva a uma situação de “presidencialismo de coalizão”, onde o presidente precisa formar alianças com vários partidos para conseguir aprovar legislação.

Em resumo, o presidencialismo é um sistema de governo com características distintas e capacidades governativas significativas. No caso brasileiro, essas características são moldadas por fatores históricos e políticos únicos.

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